Era uma casa muito engraçada, não tinha tecto, nem porta, nem nada. Era uma casa nossa, depenada, despencada, desencontrada de todas as outras. Era nossa.
Muitas vezes chovia dentro, ventava até, gelávamos por baixo da pele e batíamos os pés no chão em desatino. Quase que gritávamos. Encostávamo-nos cada um a seu canto, procurando fugir do que molha, fugir do que esfria, fugir do mau tempo que havia no meio da nossa casa sem tecto.
Não demorava muito até eu o procurar, entre tremideiras e suspiros, ou ele chegar-se a mim de mansinho, encaixando-me no seu abraço, como precisávamos os dois.
Claro que também havia os dias do sol fervente, do calor que não se podia, enchendo a casa, a nossa casa, de suores e impaciências, o desespero por uma sombra, uma frescura para nos aliviar, encostados à parede, derretidos no chão.
Nos dias suportáveis tocávamos a ponta do pé um do outro, em jeito de comunhão - isto não se aguenta, não penses em encostar-te que não dá - e escorríamos os dois, às vezes sorrindo, outras apenas de olhos fechados à espera que passasse.
A nossa casa não tem telhado, para o bem e para o mal.
Nestes tempos em que o Verão se vai e começamos a ver os dias a desaparecerem mais rápido do que o relógio mostra, ficamos apreensivos a pensar no que virá. Sabemos que voltamos, voltamos sempre, mas Invernos houve, tão gelados e escuros, em que nos mudámos, cada um para sua casa, longe daqui, longe um do outro, tentanto a vida numa casa igual às outras.
Podemos demorar mais ou menos, mas voltamos, voltaremos sempre, porque esta casa é a nossa e sabe bem encostar-me a ele, a minha mão procurar o dentro da sua camisa, encontrar o quente, oferecer-lhe tudo o que sou de cima a baixo, de fora para dentro e aquecermo-nos assim um ao outro. Mesmo com a chuva a pingar-nos a testa e o vento bravio a entrar ainda antes da noite. Mas sorrimos porque estamos em casa, na nossa casa. E porque vamos sendo felizes assim.
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