Sentou-se, abriu a boca lentamente e saiu uma longa argola de fumo. Se há coisa que sempre a atrai no acto de fumar são aqueles desenhos esvoaçantes, diáfanos, quais medusas e ainda mais quando o via fazer um coração. Coisa infantil aquela, mas a que sorria sempre. Olhava-o então, ele a fumar, ela cara virada para não sentir aquele cheiro a cigarros que tanto a incomodava.
Durante uns tempos sonhou que fumava e acordava com uma inconcebível vontade de pegar num cigarro e esfumá-lo todo num àpice. Mas, depois, o sabor dos beijos dele lembravam-na o amargo que era aquele vício quente que não despega.
Entre eles sempre um cigarro. Apesar de ele saber das asmas dela, do nariz tapado, do engolir em seco para não lhe pedir mais uma vez que deixe de fumar. E sempre a história do avô que morreu sem ar, pulmões queimados pelos tantos cigarros de tantos anos, da tosse que parecia que o ia levar a cada instante, da fraqueza em que andava já meses antes de morrer. Da despedida que não aconteceu. Do imenso que ainda queima esse adeus por dizer. Da carta que deixou ao lado do caixão - palavra feia esta, coisa feia, coisa sem jeito nem sentido - com o que devia ter dito com a mão na mão fria do avô. Mas que não conseguiu.
Ele agora vê-lhe a sombra nos olhos e no gesto, afoga a beata no copo de vinho, puxa-a para ele, encosta-a si, aperta-a, sossega-a, diz-lhe baixinho "tenho aqui uma coisa para ti", abre devagarinho a boca e ela vê sair um coração transparente, leve, esvoaçante, só para si.
Amiga
ResponderEliminarSou fumadora desde os 15 anos e, tenho 67. Tenho pena de dizer isto, tenho a falta de vergonha de dizer que não quero mesmo deixar de fumar.
Agora, fumo pouco. Logo a seguir lavo os dentes, passo um pouco de perfume no cabelo, porque não gosto do cheiro do fumo. Só fumo na varanda ou na marquise, com a janela aberta e, não há uma ponta de cigarro nos cinzeiros. Mania ou respeito pelos outros, são lavados logo. Também não fumo ao pé de crianças ou, pessoas que não fumam.
Mas o que eu gosto de ver o fumo no ar! que formas tão lindas toma!
Gostei da história e do fim.
Beijinho
Maria