Um desafio aos leitores!!

Já que umjeitomanso.blogspot.com me «anunciou» enquanto Contadora de Histórias, vamos lá pôr-me à prova! Quem se interessar, envie-me email (diazinhos@gmail.com) ou deixe comentário num dos textos, com uma palavra ou frase que me «inspire» para um próximo texto. A ver se pega e a ver se estou à altura..

terça-feira, 4 de outubro de 2011

História pedida 13 (por Helena Sacadura Cabral, frase para começo da história): RITUAIS


Era uma tarde de Outono, daquelas em que, por vezes, a nostalgia se apodera de nós. Não de mim, que gosto da estação, do sol baixo e do céu rosa que lhe são tão comuns.
Agarrada ao volante, nem eu própria sabia porque me dirigia ao Guincho.

O volante tremia nas minhas mãos e o cabelo voava em todas as direcções despenteando o que ainda agora a Benilde, do pomposo Benilde’s Hair, esteve a acertar.
Felizmente hoje não era dia de vendaval no Guincho, daqueles em que se confunde a estrada com as dunas, de tanta areia pelo ar, e em que até os caniches levantam voo. Como dizia o meu filho mais velho. O irmão colava o nariz ao vidro à espera de ver tal insólito. E o mais velho a rir-se.
Não sei porque me lembrei disto agora, nem porque vim aqui parar. ´
Mas hoje está a ser um dia estranho, um dia fora de mim. Acordei assim à procura de uma mão que me agarrasse ao acordar. Como faziam os pequenos quando acordavam de manhã e diziam que me iam visitar. E eu a encenar que dormia, de mão fingida à espera de nada, feliz por encontrá-los novamente ali todas as manhãs. Rituais. Acho que é isso que me fez falta esta manhã. Os nossos rituais.
Eles agora têm os deles, um com os filhos, outro com a sua vida. Perdemos os nossos, ganharam os deles. Há dias assim em que me fazem falta, em que esta liberdade toda que agora tenho nas minhas mãos sabe a vazio e a falta de. A falta de coisas que agora não sei nomear. Apenas falta de.
É certo que ganhei tempo e espaço para o que sou e para tornar-me cada vez mais eu. Mas também para encher-me de medos e sustos. Por eles. Os meus meninos-grandes a quem tanto quero.
Paro no bar do Guincho para um sumo.  Sim, lembro-me, tínhamos este ritual no primeiro dia de Outono.  A despedida da praia. Sempre aqui no Guincho, com chuva ou sol. Eles felizes porque já adivinhavam as castanhas a saltarem na nossa lareira e a aproximação do Natal.
Perdemo-nos na adolescência deles, nas vidas atribuladas, nas vontades de mais que sempre os encheram e que ainda hoje não lhes dão descanso. Aos meus meninos-grandes. Devia ter aproveitado para trazer o meu caderno de escrever. Pelo menos fazia-me companhia.
Hoje estou mesmo fora de mim. Hoje faz-me falta alguém ao meu lado. Hoje que é o primeiro dia de Outono, encontrei-me aqui à procura do nosso ritual esquecido.

O telefone toca. A Rita diz-me que já está no estúdio à minha espera para começarmos a gravar o primeiro do nosso novo programa. Todas as terças. Ainda me meto nestas aventuras. Tenho tempo para isso. Tenho espaço. Tenho vontade de um novo ritual. E já sei qual vai ser o meu tema de abertura de hoje. Vou falar do caniche que acabei de ver a voar no Guincho.

7 comentários:

  1. Cara Helena, aqui está a resposta ao seu desafio. Como poderá ver, inspirou-me duplamente..não foi só o seu começo que me serviu de inspiração!
    Espero que goste. Sinto uma responsabilidade (muito) acrescida por ser um «pedido» seu. Cada vez mais a admiro em vários sentidos e por múltiplas razões.
    E muito obrigada por se ter tornado visita constante.
    Se lhe apetecer, venham mais desafios!
    Obrigada
    M.

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  2. Que maravilha de história! O tema é aliciante e, sugestivo. Quem não tem rituais? Habituamos-nos a eles e, quando desaparecem, sentimos a falta deles. Inventamos outros, habituamos-nos, voltamos a perdê-los. São ciclos, pedaços de vida, coisas que não esquecemos nunca.
    Já tive os rituais de filha, mulher, mãe, avó. Alguns ainda os recupero de vez em quando. Outros...
    Lembro-me de todas as noites, antes de me deitar, ir ao quarto dos filhos, beijá-los, acariciar as cabecinhas, aconchegar a roupa. Onde isso vai!...
    Agora, o ritual é outro. Depois de dar uma voltinha pelos blogues amigos, como se estivesse a dizer: "Até amanhã", vou para o quarto, desejo uma boa noite aos filhos e netos, olho as fotos dos meus pais que já partiram, numa saudade muda, faço uma festa ao velho canito, beijo o meu marido e, digo, mesmo que já durma, dorme bem, meu amor. Este último ritual dura há 45 anos, o tempo deste amor. Espero, guarda-lo, muitos anos.
    Boa noite, minha nova amiga. Hoje, foi a primeira a quem o desejei.
    Maria

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  3. Cara M.
    Bela história no tom, no ritmo, na palavra.
    Há muito tempo, costumava ler em primeira mão uma história de um escritor de quem muito gosto e hoje é muito conhecido.
    Depois, eu pegava nela e dava-lhe seguimento. E ele retornava. Até que um de nós terminava. E aquele que a acabara, recomeçava com outra.
    O que morrer por último há-de, um dia, publica-las...
    Obrigada pelo prazer que me deu!

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  4. Oh, menina, que engraçada e terna que ficou esta sua pequena história. É uma leitura que prende, a sua. E consegue dar sempre um ar de sua graça. Dá vontade de lhe ir aqui deixando novos pedidos para ver a volta que lhes dá... mas hoje vou-me conter.

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  5. Cara Helena,
    Muito obrigada pelas suas gentis palavras.
    O meu sonho é um dia poder viver da escrita - prosa, poesia, músicas, o que for. O espartilho dos horários do trabalho numa empresa muitas vezes sufoca-me. Fico sem tempo para o meu mundo, a minha escrita e, acima de tudo, custa-me ficar com o tempo contado para acompanhar o crescimento dos meus dois filhos (dois rapazes também) que são ainda tão pequeninos.
    Infelizmente não tenho a sorte de ter algum amigo escritor. Tenho muito bons amigos no mundo das artes - pintura, artes plásticas, música - mas ninguém com este amor e necessidade da palavra escrita.
    Por isso sorri com um «quem me dera...» ao ler da sua história com o seu amigo escritor. Deve ser muito bom ter esse tipo de relação, cumplicidade e paixão partilhada.
    Apetece-me muito dizer que gostaria de ler essas histórias encadeadas, mas sem ter que haver a morte de um...Terá mesmo que ser assim?
    Mais uma vez obrigada pela honra e sempre que lhe apeteça, deixe mais um «desafio». Não imagina o prazer que me dá inventar histórias.
    Obrigada
    M.

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  6. Cara Maria
    gostei tanto do seu comentário e de ter partilhado comigo um bocadinho da sua história!
    Que ternura esse seu ritual. Muito obrigada por incluir-me também, por hoje.
    O seu marido só pode ser um homem de sorte, com esta declaração...45 anos! Coisa rara hoje em dia. Parabéns!

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  7. Olá, História de nós

    Conto excelente! A vida é feita de rituais e há alguns que já fazem parte de nós, como o vir aqui...

    Cada dia que passa 'isto' está a tornar-se mais emocionante.

    Voltarei.

    Bj

    Olinda

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