Um desafio aos leitores!!

Já que umjeitomanso.blogspot.com me «anunciou» enquanto Contadora de Histórias, vamos lá pôr-me à prova! Quem se interessar, envie-me email (diazinhos@gmail.com) ou deixe comentário num dos textos, com uma palavra ou frase que me «inspire» para um próximo texto. A ver se pega e a ver se estou à altura..

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Fechado para obras

Encerrei parte de mim assim que a vi subir aquela rua com aquele meio sorriso e aquele decote azul naquele passo descompassado. Vinha de lá para cá, de cá para lá, cheia de si e de rua, cheia de risos lá dentro e meios sorrisos à mostra. Olhava-a meio escondido da janela do meu quarto e adivinhava tudo o que ia perdido nos contornos divididos pelo azul de um vestido demasiado apertado.

Com o peito arfando nas rugas de nylon, as longas pernas queimadas pelo sol de S. João encarrapitadas no alto de uns sapatos altos de mais, encarnados de mais, feios de mais, velhos de mais, a bolsa preta apertada contra as curvas de uma barriga que já fora lisa e uns olhos gulosos de quem anseia por tudo, ela subia a rua com vontade de mim.

Mas eu olhava-a atrás do cortinado já gasto, via-a assim e fechava aquele recanto de mim em que guardava a alegria de todos os encontros e vindas dela.

Percebi que hoje não seria o seu primeiro, que hoje já tinha tido um outro qualquer, se calhar aquele da Paiva Couceiro que lhe trapisca o olho sempre que a ver passar, que assobia quando vê aquelas pernas que me apertam nos momentos mais temidos, quando sente o cheiro do seu perfume a sexo oferecido. E ela deixa cair o seu sorriso de quando pensa que não a estou a ver.

Mas hoje sei que não cumpre o que me diz no calor dos meus lençóis, que não vou ser a sua primeira cama do dia, que o que eu lhe pago ou não pago não interessa, porque comigo fecha os olhos e pode apenas ficar, a minha respiração à procura da sua, a minha pele a pedir a dela, o corpo dela enleado no meu enquanto treme em pesadelos sem fim e me aperta entre si com toda a força da vida que a esvazia. Para depois acordar a soluçar.

Vejo-a subir a rua naquele passo gingado, naquela dança só sua e sei que hoje esteve com outro alguém, alguém que lhe encheu aquela mala preta que aperta com medo que lhe fujam as notas de 100, alguém com quem não consegue adormecer, alguém que não a embala ao acordar, mas que a deixa sem ter que pensar na manhã seguinte, nas contas sem fim, na mãe que ja não sabe quem é ou no vestido que é preciso remendar.

Melhor que seja isso e que não tenha sido alguém que ela encontrou e que a faz finalmente sossegar, alguém para quem corre antes de todos os outros alguens, que a enche de rios rosa e amores sem fim, alguém que antes era eu e agora já não sou.





 

1 comentário:

  1. Finalmente decidiste-te a ter o teu espaço de escrita. Sempre foste uma contadora de histórias e sempre adoraste escrever.

    Sei que um dia publicarás as tuas histórias em livro e acho que este blogue vai ser o teu treino, até que ganhes asas e voes como sempre desejaste.

    Boa sorte que bem a mereces!

    Beijocas.

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